sexta-feira, 27 de novembro de 2020

"Cartada final", de John Grisham


Afinal, qual foi "a cartada final"? Eis aqui mais um caso de tradução bizarra de título. No original, "Os guardiões", que faz total sentido, uma vez que remete ao trabalho dos advogados que defendem pessoas inocentes que estão no corredor da morte. 

O livro de John Grisham utiliza uma argumento poderoso para desenvolver seu novo exemplar de thriller jurídico. A crítica social surge em alguns momentos, mas não é a tônica do projeto. O autor foca mais na investigação, a fim de manter o leitor fisgado do início ao fim. 

Em compensação, Grisham empolga-se por demais e inclui elementos que não são críveis em uma narrativa inspirada em história real. O escritor chega a criar subtrama que envolve uma casa assombrada, algo totalmente descartável. 

"Cartada final" encerra com a sentença do júri, mas não oferece desdobramentos. Poderia ter sido mais enfático na sua mensagem política, mas perde a oportunidade. Ademais, as soluções para um mistério de mais de 20 anos são simplistas. Não há como negar a habilidade do autor em desenvolver uma narrativa envolvente, mas, no fim, parece mais caça-níquel do que obra preocupada em transformar a sociedade. 


BOM
27/2020

quinta-feira, 26 de novembro de 2020

"Como Woody Allen pode mudar sua vida", de Éric Vartzbed

Adquiri este livro em 2016, assim que foi lançado no país, mas não consegui persistir na leitura. Não era o que eu esperava. Neste "ano literário", decidi oferecer uma nova chance para "Como Woody Allen pode mudar sua vida" e aproveitei muito mais a visão de Éric Vartzbed para os filmes de um dos meus diretores favoritos. 

O autor concede uma análise psicológica para os personagens de dezenas de longas-metragens de Allen. Não chega a ser autoajuda, como o título pode induzir. São pensamentos interessantes, organizados tematicamente. Já me cativou pelo fato do filme "A outra", meu preferido, ser o ponto de partida do livro e, também de diversas perspectivas. 

Mesmo tendo míseras 80 páginas, esta foi a obra da minha modesta coleção que mais sublinhei trechos. A leitura, certamente, desperta a vontade de (re)ver a filmografia completa do cineasta.


MUITO BOM
26/2020

quarta-feira, 25 de novembro de 2020

"A cidade dos hereges", de Federico Andahazi


Em "A cidade dos hereges", Federico Andahazi crava o dedo numa das principais feridas da humanidade ao realizar uma feroz crítica à Igreja Católica. A leitura é pesada e oferece constantemente um gosto amargo. A trama inclui estupros e mortes variadas, inclusive uma Via Crúcis. É tanta violência que dói o peito em certas páginas. Tudo transcorre em nome da fé. 

O escritor argentino utiliza o mito do Santo Sudário de Turim como fio condutor da narrativa. A partir deste objeto, escancara-se o quanto a religião é feita pelos homens, na maioria ardilosos em suas ações em busca da dominação. 

O resultado é fascinante, mas o livro tem seus pontos fracos: parágrafos muito longos e descritivos, sendo alguns trechos redundantes e/ou preciosistas. As passagens que envolvem o manuscrito de Christine são cansativas, por exemplo, e enfraquecem o ritmo da narrativa. Também há um atropelo dos acontecimentos nas últimas páginas. 

Mesmo com algumas derrapadas na construção, a maioria da parte técnica, "A cidade dos hereges" é poderoso e sua mensagem reverbera por muito tempo depois do término da leitura.  


MUITO BOM
25/2020

terça-feira, 24 de novembro de 2020

Quotes SFU - 22


É o aniversário de Nate e ele está olhando um álbum de fotografias antigo. O pai dele aparece. 
Nathaniel: O dia que eu fiz 40 anos, você estava na Europa. Passei o dia imaginando se você telefonaria...
Nate: Sinto muito
Nathaniel: Não se desculpe. Você fez o que precisava
Nate: Tantas coisas aconteceram desde que essas fotos foram tiradas. Tantas. Pensar em meus 40 anos...
Nathaniel: Os próximos 40 anos passam mais depressa. Eles passarão sem que você perceba. 
Nate: O tempo voa quando nos divertimos, não é?
Nathaniel: Não. O tempo voa quando fingimos nos divertir. 


Six Feet Under S05E03

segunda-feira, 23 de novembro de 2020

"O menino do pijama listrado", de John Boyne

Na onda de conhecer mais obras de John Boyne, optei por reler o título que o tornou famoso mundialmente. E é compreensível o porquê de "O menino do pijama listrado" ter sido um sucesso. A premissa de duas crianças conversando através da grade de um campo de concentração nazista é muito potente. 

Nas páginas, o autor oferece diálogos curiosos e boas reflexões. Porém, carece de uma mão mais pesada e crítica para desenvolver - ou aprofundar - certas questões. Parece que a ideia se esgota rápido, o que faz o livro ser concluído com menos de 200 páginas. Talvez a proposta de ser "infanto-juvenil" tenha freado essa abordagem, deixando a sensação de que "O menino do pijama listrado" poderia ter sido esplêndido, memorável, um clássico. Ainda assim, segue uma ótima leitura. 


MUITO BOM 
24/2020

sexta-feira, 20 de novembro de 2020

"Intérprete de males", de Jhumpa Lahiri


Nove contos sobre pertencimento, raízes, imigração e relações culturais integram "Intérprete de males", obra vencedora do Prêmio Pulitzer em 2020. O grande destaque é a escrita esplêndida de Jhumpa Lahiri, que, com poucos parágrafos, consegue segurar totalmente a atenção do leitor a partir de um olhar sensível para assuntos potentes. 

O livro reúne momentos inspiradíssimos, como o conto de abertura "Uma questão temporária", e outros nem tanto, vide "Uma casa abençoada". Vale destacar "Quando o sr. Pirzada vinha jantar", "Sexy" e o otimista "O terceiro e último continente". O gosto amargo surge pela forma abrupta como a escritora decide encerrar suas histórias, geralmente provocando frustração. 


BOM
23/2020

quarta-feira, 18 de novembro de 2020

Quotes SFU - 21

"Toda vez que você tenta ter uma vida normal, você estraga tudo. Você nunca terá o momento 'felizes para sempre'. Não importa quantos véus você vista. Você não serve para isso. Aceita, em vez de tentar ser o que você não é" - Lisa para Brenda, no seu dia de casamento 


Six Feet Under S05E01

segunda-feira, 16 de novembro de 2020

Som e fúria - a célebre frase de "Macbeth"


"A vida não passa de uma sombra que caminha, um pobre ator que se pavoneia e se aflige sobre o palco - faz isso por uma hora e, depois, não se escuta mais sua voz. É uma história contada por um idiota, cheia de som e fúria e vazia de significado"

William Shakespeare

sexta-feira, 13 de novembro de 2020

"Macbeth", de William Shakespeare


Depois de inúmeras tentativas sem sucesso, "Macbeth" se apresenta como minha primeira experiência completa com Shakespeare. Consegui vencer a dificuldade (ou estranheza) do linguajar do século 16 e fiquei fascinado com o formato teatral, sendo possível imaginar as cenas ganhando vida em um palco vitoriano. 

Este é um dos textos mais curtos do autor inglês, talvez por isso senti um atropelo nos acontecimentos. Já conhecia a história a partir da adaptação literária infanto-juvenil e do filme recente estrelado por Michael Fassbender e Marion Cottilard. Aliás, tenho um fascínio pelos acontecimentos envolvendo o general do exército Macbeth, sua esposa maquiavélica, o colega Banquo, o rei Duncan e as três bruxas proféticas. Por este envolvimento, acreditava que iria me deparar uma "vilã" mais atuante na trama, por exemplo. 

"Macbeth" oscila entre uma linguagem acessível e dinâmica com aforismos rebuscados, principalmente em trechos que personagens tendem a filosofar sobre suas ações. Por vezes, torna-se artificial e enfadonho. Mas, como tudo é resolvido rapidamente, não faz desanimar. Quero avançar em mais leituras de Shakespeare em 2021!


MUITO BOM
22/2020

quarta-feira, 11 de novembro de 2020

Quotes SFU - 20

Brenda: Eu senti a sua falta. Nessa situação... (doença e enterro de seu pai)
Nate: Eu também senti a tua falta. Eu não sei o quanto eu mudei, estando com você. Quanto você me fez crescer como pessoa. Eu não seria o que eu sou hoje se eu não tivesse te conhecido.
Brenda: Você me mudou também.
Nate: É mesmo? Como?
Brenda: Você foi a primeira pessoa que eu perdi e me custou algo. Por isso, eu nunca mais estive com ninguém.
Nate: Ninguém?
Brenda: Eu tenho pavor de estragar tudo de novo.
Nate: Você vai encontrar alguém.
Brenda: Essa não é a solução. Você sabe o que eu acho?
Nate: Sobre o quê?
Brenda: Eu não sei. Sobre a vida.
Nate: O quê?
Brenda: Eu acho que é uma questão de sincronia (timing). Sincronia é tudo.
Nate: Você pode ter razão.


Six Feet Under S03E07

segunda-feira, 9 de novembro de 2020

"Southernmost - Rumo ao sul", de Silas House


"Southernmost" é uma história sobre mudança de perspectiva a respeito da vida. Asher percebe que, depois de anos sendo pastor em uma comunidade isolada e conservadora, não pode viver sobre aquilo que não acredita: valores da igreja, cultura de ódio e falsidade. O estopim é o preconceito a um casal homossexual que se muda para o local. A partir dessa mudança, Asher pega estrada junto do filho para a ilha de Key West, o ponto mais ao sul dos Estados Unidos, a fim de tentar se aproximar do irmão gay que renegou no passado. 

O livro de Silas House aborda vários temas urgentes de maneira leve. Utiliza da ficção para transmitir sua mensagem de aceitação da diferença, o que por si só já é poderoso. Esperava que o casal homossexual recém chegado no vilarejo fosse mais desenvolvido nas páginas, gerando uma "guerra" na cidade. Mas, o protagonista foge do confronto, tornando-se uma escolha curiosa da narrativa. Pois, o foco de "Southernmost" é a figura de um sujeito repassando suas escolhas e tentando reverter o tempo perdido para dar lugar ao que realmente importa: o amor. 

observação: Minha única crítica vai para o irmão do pastor, Luke, que se tornou padre (?!) e não recebe merecido desenvolvimento na trama. 


MUITO BOM
21/2020

sexta-feira, 6 de novembro de 2020

"Condado de Essex", de Jeff Lemire


Graphic novel em três volumes, "Condado de Essex apresenta histórias independentes que são conectadas ao final, quando uma árvore familiar é revelada. O desenrolar é sufocado por uma atmosfera melancólica, na qual todos personagens carregam tragédias. Estaria no sangue das várias gerações? 

O destaque vai para o talennto de Lemire em transmitir os sentimentos de seus protagonistas através dos quadrinhos. Por vezes, impressionante. Os dois primeiros volumes são mais interessantes. O terceiro perde em ritmo e força, sem concluir no auge. Vale a experiência, porém sem altas expectativas. 

BOM
20/2020

quarta-feira, 4 de novembro de 2020

Quotes SFU - 19

Brenda: Eu não quero odiar meus pais mais do que eu já os odeio.
Scott: Você vai acabar perdoando os dois.
Brenda: Também não quero fazer isso. Não quero ser uma dessas pessoas horríveis que sofrem o tempo todo.
Scott: E nos momentos em que sofre?
Brenda: Escolho não sofrer.
Scott: Qual é o problema de sofrer um pouco?
Brenda: Eu sinto que vou morrer.
Scott: Você não morre.


Six Feet Under S02E13

segunda-feira, 2 de novembro de 2020

Principal ensinamento de "O garoto no convés"

"Quem tem confiança em si não precisa lembrar os outros do seu status social superior, mas os que não a têm acham necessário nos empurrar isso goela abaixo vinte vezes por dia"

John Boyne

domingo, 1 de novembro de 2020

"O garoto no convés", de John Boyne

Ao redescobrir John Boyne esse ano, resgatei a minha cópia de "O garoto no convés" adquirida em 2009, logo após  o sucesso de "O menino do pijama listrado". A leitura confirmou que o escritor irlandês possui um jeito fluído e envolvente com as palavras. Suas narrativas despertam curiosidade e tornam a leitura voraz. 

O romance é baseado no episódio verídico de 1789: o motim do navio Bounty. Os fatos são apresentados pelo ajudante do capitão, a partir de um viés novelesco. São quase 500 páginas para um trama interessante, porém previsível e, por vezes, repetitiva - principalmente ao abordar o traumatizante passado do protagonista. De qualquer forma, o passatempo é garantido e, de quebra, sabe-se mais sobre um relato de sobrevivência que entrou para a História. 


observação: bizarra a tradução do título para português, uma vez que, no original, é "O motim do Bounty" ("Mutiny on the Bounty"). "O garoto no convés" provavelmente foi escolhido pela Companhia das Letras a fim de pegar carona do livro mais famoso do escritor. 


BOM
19/2020

quarta-feira, 14 de outubro de 2020

"Carrossel sombrio e outras histórias", de Joe Hill

O livro do mês de aniversário da TAG me apresentou Joe Hill. Este nome já havia chegado até mim, mas não sabia que o escritor era filho do mestre Stephen King. A constatação me deixou empolgado em pegar para ler a coletânea "Carrossel sombrio", lançada em 2019 e que oferece 13 histórias envolvendo fantasia, psicologia, horror e dramas familiares. 

Logo de imediato, as narrativas chamam atenção pela habilidade em que o escritor, no início de cada conto, joga o leitor no meio de um acontecimento em curso, apresentando aos poucos as pistas do que realmente está acontecendo. Esta escolha desperta a curiosidade em desvendar cada uma das perturbadoras histórias. 

Se, por um lado, o autor sabe como envolver seu público, por outro, apresenta uma incapacidade em oferecer finais satisfatórios. A maior parte das narrativas perde impacto justamente em seus desfechos, chegando a soar como inacabadas ou experimentais. 

Ainda assim, o conteúdo reunido em "Carrossel sombrio" é bastante diversificado, com espaço para homenagem a filme de Steven Spielberg ("Alta velocidade"); experimentações na forma escrita ("O diabo na escada" e "Twittando no Circo dos Mortos"); parceria com o pai famoso ("Campo do medo"); e flerte com ficção científica ("Devoluções atrasadas").

Como a maior parte dos livros de contos, o saldo é irregular. Os melhores são: "Tudo o que me importa é você", que utiliza de uma alegoria futurista para abordar a dificuldade existente nas relações humanas, e "Estação Wolverton", o qual considero uma visão extremamente ácida sobre a frase "O homem é o lobo do homem", de Thomas Robbes. 

Vale destacar a introdução do livro em que Joe Hill conta como é ser filho de Stephen King e, ainda em tempo, a edição mais do que caprichada da TAG Inéditos, repleta de belíssimas ilustrações, sendo capazes de tornar a experiência ainda mais imersiva. 

BOM
18/2020

terça-feira, 6 de outubro de 2020

Quotes SFU - 18

Karla: Eu posso ser uma drogada, mas eu nunca machuquei a minha filha.
Keith: Era assim que as pessoas criavam os filhos antigamente. Cansei de vê-la culpar o pai pelas coisas erradas na sua vida. 
Karla: Por favor, você sabe como qualquer coisinha o faz perder a cabeça.
Keith: Eu acho que ele mudou. As pessoas mudam. 
Karla: As pessoas não mudam. Elas envelhecem, só isso.


Six Feet Under S02E11

segunda-feira, 5 de outubro de 2020

"A filha do rei do pântano", de Karen Dionne

Drama e thriller ao mesmo tempo, "A filha do rei do pântano" é um conto complexo e, por vezes, perturbador. Conta a história de Helena, uma jovem mulher fruto de um sequestro. Sua mãe foi raptada e mantida em uma cabana na floresta, onde a protagonista nasceu e permaneceu sem saber a verdade até aos 12 anos, quando foi resgatada. Enquanto viveu isolada, desenvolveu um forte vínculo com o pai criminoso. 

Agora, depois de muitos anos preso, o sequestrador foge da penitenciária. Então, Helena decide caçar seu pai, pois sabe que é a única pessoa capaz disso, em virtude de ter sido treinada por ele, com a capacidade de percorrer o pântano e seguir seus rastros. 

"A filha do rei do pântano" é uma leitura viciante, pesada e curiosa. A protagonista navega por sentimentos conflitantes durante toda sua jornada, entre amor e ódio dirigido ao seu opressor. O caminho em busca da superação se revela bastante violento conforme Helena precisa lidar com diversos traumas. Recomendo!


MUITO BOM
17/2020

sexta-feira, 2 de outubro de 2020

Quotes SFU - 17

Nate: Eu ainda não contei para ela (Brenda) sobre a minha doença.
Ari: Como não contou isso para a sua alma gêmea?
Nate: Nem sei se ela é minha alma gêmea.
Ari: Entendi. Ela não é a sua alma gêmea, mas vai se casar porque não tem nada melhor para fazer?! Que ótimo.
Nate: Ei, eu nem sei o que é alma gêmea. Você sabe?
Ari: Aquela pessoa que o leva a ser o mais autêntico possível. Talvez a sua alma gêmea seja... a pessoa... que mais force a sua alma a crescer. Nem todo crescimento dá prazer.


Six Feet Under S02E07

quinta-feira, 1 de outubro de 2020

Algum barulho para: "Mrs. America"

 

"Mrs. America" é uma minissérie que acompanha um importante capítulo da história do movimento feminista. O foco é a articulação de lideranças durante a década de 1970 nos Estados Unidos. De um lado, as progressistas, que defendem direitos iguais entre homens e mulheres, do outro, as conservadoras, que temem perder seus "privilégios" de donas de casa. 

O debate é curioso e provoca interessantes questionamentos. Porém, também soa de gosto duvidoso ao humanizar a personagem de Phyllis Schlafly (Cate Blanchett), advogada que lutou contra o aborto, o casamento entre pessoas do mesmo sexo, o ingresso de mulheres nas forças armadas e a ampliação de direitos trabalhistas para mulheres. Todas essas causas faziam parte da Equal Rights Amendmant (ERA). 

A atração televisiva da FX acompanha os bastidores da campanha da ERA através de votações em cada estado norte-americano. Apresenta figuras valiosas da luta feminista, como Gloria Steinem (Rose Byrne), Betty Friedan (Tracey Ullman), Bella Abzug (Margo Martindale), Shirley Chrisholm (Uzo Aduba) e Jill Ruckelschaus (Elizabeth Banks). Praticamente uma aula sobre cada uma dessas mulheres, já que os capítulos são temáticos e focam num nome por vez. 

O ponto alto, sem dúvidas é o elenco poderoso, tendo Blanchett a frente com mais uma brilhante performance. Sua Phyllis gera demasiado incômodo ao provocar simpatia e repulsa ao mesmo tempo. Incômodo também é o sentimento ao retratar uma luta entre mulheres, uma vez que deveriam se unir contra o verdadeiro inimigo: o machismo. Por vezes, falta sororidade em tela. "Mrs. America" perde a oportunidade de investir em uma mensagem mais enfática, sem conceder tanta voz e espaço para argumentos perigosos. 


BOM

sábado, 26 de setembro de 2020

"Grandes Esperanças", de Charles Dickens

"Grandes Esperanças" é um novelão dos melhores. Conta a história do jovem Pip, órfão que recebe uma herança, renega o passado e se muda para Londres, a fim de tentar se inserir na alta sociedade e obter equiparidade social para conquistar Estella, um amor à primeira vista despertado na infância.  

Familiarizado (e fã) do filme de 1999, uma versão moderna do original, não esperava encontrar tantas subtramas e camadas oferecidas por Dickens. O terceiro ato, por exemplo, pouco aborda o romance entre Pip e Estela, considerada a tônica da narrativa. Há muito mais a ser resolvido em sua entrelaçada trama. 

Ao ler as mais de 700 páginas, a primeira impressão é que muitos dos capítulos são despropositados. Bastante enrolação e desvios do foco principal da narrativa. Ledo engano. O escritor britânico costura muito bem os arcos de cada personagem, o que tornou uma grata surpresa perceber que o livro é muito mais complexo do que esperava. 

Surpreendi-me ao constatar que Magwitch é um dos protagonistas! Vários outros personagens ganham destaque, como o advogado Jaggers, seu ajudante Wemmick, a jovem Biddy, a Mrs. Joe e o amigo Herbert. 

Além de um certo desconforto com alguns trechos empolados, o único apontamento é que Dickens poderia ter feito uma crítica mais feroz para a burguesia inútil da época (ou de sempre?). Foi contida, mas a mensagem se faz presente. Ainda assim, não restam dúvidas de que "Grandes Esperanças" é um clássico. Quero mais Dickens!


MUITO BOM
16/2020

sexta-feira, 25 de setembro de 2020

Apenas algumas vezes...

            

Trecho do filme "Antes do pôr do sol" (2004), de Richard Linklater

quinta-feira, 24 de setembro de 2020

Watchmen, de Alan Moore e Dave Gibbons

Mais de três décadas depois da publicação, "Watchmen" segue brilhante. Sua linguagem e construção de narrativa impressionam a cada página, sendo praticamente o storyboard de um longa-metragem. Aliás, Zack Snyder fez poucas mudanças ao realizar sua fiel adaptação da obra para o cinema. 

Porém, nem tudo é perfeito. O ritmo da história oscila bastante, principalmente quando mescla com uma subtrama envolvendo um pirata ou diálogos entre um garoto e um jornaleiro. Mas, isso não é nada comparado aos problemas mais sérios de "Watchmen", que recaem no viés preconceituoso, tanto gordo quanto homofóbico. Mesmo que por vezes seja proferido pelo questionável Rorschach, o roteiro parece que valida esses argumentos. Outro equívoco grave é a romantização de um estupro, sendo no mínimo revoltante. 

Para além dessas questões, que podem ser amenizadas pelo contexto histórico, "Watchmen" é uma obra-prima, uma vez que sua atmosfera steam punk, o teor urgente de mudança política e os dramas humanos são atemporais. Mais que uma HQ clássica sobre super-heróis, é uma reflexão sombria e melancólica sobre a humanidade. 


MUITO BOM
15/2020

domingo, 6 de setembro de 2020

O abismo nos olha de volta



"Somos uma sociedade de deprimidos, de angustiados, e não conseguimos lidar com esse fenômeno que é viver. É como se a vida no século 21 tivesse perdido completamente a razão de ser. Nós não vivemos a vida, nós vivemos por curtidas na rede social, nós vivemos para exercer poder sobre os outros, nós vivemos para fingir que não somos mortais. É esse o nosso grande abismo".


Viviane Mosé

quinta-feira, 27 de agosto de 2020

Quotes SFU - 16

 

Sra. Collins: Você pensa que é um dia como qualquer outro, mas não percebe que qualquer coisa pode acontecer. E aí, pronto. Acontece. E tanta coisa ficou sem ser dita. E foi tudo desperdício de tempo. Só queria que alguém me ajudasse a entender. Só me ajudar... Você pode me ajudar?
Nate: A primeira frase de "A anatomia de uma dor", de C. S. Lewis, é: "Nunca me disseram que o sentimento de perda se parecia tanto com medo". Acho que esse livro vai ajudar. Tudo ficará bem.
Sra. Collins: Não, não vai. 


Six Feet Under S02E06

quarta-feira, 26 de agosto de 2020

A casa assombrada, de John Boyne

John Boyne sabe envolver o leitor nas suas histórias. Aqui não é diferente. "A casa assombrada" é sua homenagem aos clássicos contos de fantasmas em uma mansão vitoriana. Por vezes, parece uma mistura de "O jardim secreto" com "A volta do parafuso/Os inocentes". Referências estão em todos os lugares, inclusive para o mestre Charles Dickens. 

A narrativa acompanha Eliza Caine, uma jovem londrina que vai trabalhar como governanta em Gaudlin Hall, um casarão localizado no interior da Inglaterra. Ela fica responsável por duas crianças, Isabella e Eustace, mas, estranha que os pais deles não se encontram no local, nem mesmo outros criados. 

Como de costume, as páginas escritas por Boyne são devoradas com muita sede. Embora seja uma leitura extremamente agradável, não há personalidade na trama ou novidades acrescidas ao gênero. O autor desenvolve com afinco personagens cativantes e uma atmosfera misteriosa, porém sua casa assombrada não se torna memorável. 


BOM
14/2020

terça-feira, 25 de agosto de 2020

O desconhecido e seus riscos


"Às vezes, você tem que apenas fazer a escolha e saltar"

Trecho do filme "Before We Go" ou "Antes do Adeus" (2014)

segunda-feira, 24 de agosto de 2020

Rotina poética do jornalista



Em 2016, produzi para o Programa de Pós-Graduação em Artes Visuais (Mestrado) da Universidade Federal de Pelotas o registro do meu território enquanto jornalista. No caso, o ambiente da redação do jornal Diário Popular, situado em Pelotas-RS. As redações de jornais impressos não costumam ser visitadas pelo público em geral. São lugares praticamente secretos, esconderijos para onde os repórteres se refugiam após voltar das pautas: o abrigo da escrita. 
Os jornalistas dos veículos impressos têm apenas seu nome assinado junto das matérias. Não há outras maneiras de reconhecê-los ou identificá-los. Seus rostos não invadem as casas das pessoas. Esse anonimato também é compartilhado com outros colegas de profissão, como radialistas e assessores de imprensa.


O vídeo acompanha o trajeto de entrada no jornal e o labirinto até chegar à redação, localizada no segundo andar. Observa-se uma sala ampla, retangular, opaca, habitada por mais de 30 pessoas em seus pequenos espaços, quase cubículos. É um lugar sem vida, monocromático, na sua maioria em tons de bege. O meu canto, entretanto, destaca-se em meio à paisagem apática ao apresentar traços de personalidade, principalmente influenciados pela relação com a cultura.


Revela-se ainda o ambiente de produção e, também, o processo de escrita e o caminho até a publicação. Estão ali as páginas dos blocos de anotações, o digitar incessante no teclado, a formação de frases na tela do computador, as tintas da gráfica e a gravação das páginas impressas no setor de máquinas. Todo um processo até o jornal estar pronto para sua distribuição.


O trabalho audiovisual oferece potência àquele fazer que não é notícia, aos bastidores de uma prática que apresenta forte impacto social, oferecendo um olhar poético para esse oficio e para o espaço em que é desenvolvido. Busca ativar o olhar sensível para diferentes rotinas, uma vez que existe poesia em qualquer tarefa, mesmo sendo cotidiana e repetitiva.

sábado, 22 de agosto de 2020

Quotes SFU - 15

Brenda: Como foi seu dia?
Nate: Foi uma mulher gritando com o cadáver dilacerado do marido, que a batia. Imagina odiar tanto uma pessoa e ficar 20 anos com ela?
Brenda: O que o leva a pensar que as pessoas ficam juntas para serem felizes?

Six Feet Under S02E06

sexta-feira, 21 de agosto de 2020

Muito barulho para: "When we rise"


Considerada a "Bíblia do movimento LGBT", a minissérie "When We Rise" (ou "Quando Fazemos História) é uma preciosidade que precisa ser descoberta. Foi exibida em 2017 pelo canal aberto ABC, fazendo alarde nos Estados Unidos, mas por aqui pouco se falou dessa inspiradora produção. Possui a assinatura do roteirista Dustin Lance Black, vencedor do Oscar por "Milk: A voz da igualdade".

Numa mistura de drama e documentário, os episódios acompanham a luta contra o preconceito ao longo de várias décadas, mais precisamente de 1970 a 2010 em São Francisco e Nova York. Cada núcleo de personagens é inspirado em uma história real, sendo todas oriundas do livro do ativista Cleve Jones, o protagonista da atração.

O elenco é repleto de nomes conhecidos, como Guy Pearce, Mary Louise-Parker, Rachel Griffiths, Whoopi Goldberg, Rosie O'Donnell e Michel Kenneth Williams. Também há destaque para novatos, como Austin P. McKenzie e Jonathan Majors.

"When We Rise" é obrigatório para qualquer LGBT. São apenas oito episódios. Além de uma jornada emocionante e poderosa, serve como registro para avanços importantes da humanidade que não podem jamais retroceder.

MUITO BOM



quinta-feira, 20 de agosto de 2020

O sentido da arte (e da vida)


"O trabalho do artista não é sucumbir ao desespero, mas encontrar um antídoto para o vazio da existência" - Gertrude Stein para Gil

Trecho do filme "Meia-noite em Paris" (2011)

quarta-feira, 19 de agosto de 2020

O labirinto de Francesco Clemente


Apresento algumas pinturas do artista italiano Francesco Clemente. São obras desenvolvidas para o filme “Grandes Esperanças (Great Expectations)”. Lançado em 1998, este drama é uma adaptação moderna do clássico romance de Charles Dickens. Clemente produziu mais de 200 trabalhos para integrar o longa-metragem. 


As obras são essenciais para a narrativa. O personagem principal, Finn, é um jovem pescador que possui dons artísticos desde criança. Com 20 e poucos anos, recebe o convite para expor em Nova York. A mostra é um sucesso e Finn vende todos os trabalhos na vernissage. A realização profissional é importante na história, pois significa a entrada do protagonista para o mundo dos ricos. Um passaporte para conseguir a garota que ama.



Os desenhos de Clemente dão vida a esse universo criativo do personagem. São tão impactantes em cena, que, na primeira vez que assisti “Grandes Esperanças”, as obras me causaram profunda estranheza. Porém, percebi que aquelas imagens ficaram na minha cabeça por muito tempo.


A cada oportunidade de rever o filme, mais fascinado fiquei com a obra do artista, a ponto de buscar seus trabalhos produzidos para além do cinema. Encontrei, então, uma coleção de inúmeros trabalhos, realizados desde a década de 1970 até hoje. O italiano pinta autorretratos, seres híbridos, figuras explicitamente sexuais, cenas religiosas ligadas ao hinduísmo e até celebridades.

Clemente vale-se de várias correntes artísticas, como renascimento, surrealismo e expressionismo. É considerado um dos principais expoentes da Transvanguarda, movimento italiano da pós-modernidade. Cunhada em 1979, a Transvanguarda libera seus artistas para transitar por qualquer época ou estilo do passado, com expressividade de cores e referências.



Desvendar as obras de Francesco Clemente não é uma tarefa fácil. Pouco se encontra de informações sobre o artista na internet. O destaque vai todo para as suas criações. A partir daí, a interpretação é livre. Figuras deformadas, grotescas, metamorfoseadas. Um universo ora onírico ora realista.



No filme, os principais personagens são representados em desenhos, tanto nos créditos iniciais quanto nos quadros da exposição do protagonista. As distorções, ao mesmo tempo que parecem se afastar da aparência dos atores, também se aproximam dos mesmos. Encontra-se a alma dos personagens naqueles traços de aquarela, grafite e giz colorido.




De onde vem essa estética? Essa força visual? Essa presença artística? Francesco Clemente oferece uma visão particular de enxergar o mundo. Carrega suas obras de emoção, de repulsa, de ternura, de crítica social e de infinitas possibilidades.



O que possuem em comum, na sua maioria, são grandes olhos. Estão ali, em cada ser representado. Olhos abissais, como dois pontos magnéticos nas imagens. Assemelham-se ao trabalho da pintora norte-americana Margaret Keane. Haveria alguma inspiração? Difícil dizer. Influências claras no trabalho de Clemente são de Andy Warhol e Basquiat, uma vez que foram amigos e vizinhos em Nova York.


Fora as referências, os olhos ainda permanecem na minha cabeça. Olhos que olham o espectador. Há uma espécie de cumplicidade com aqueles personagens. Não sorriem. Apenas miram apreensivos. Parecem estar dividindo suas angústias mais íntimas.



O artista retrata esses seres, o mundo ao redor e suas interações. Retrata o que vê, o que lhe concede sentido ao mundo. Uma realidade de várias verdades, interpretações e diversidade de expressões. É múltiplo em temas e desconstruções. Cada peça traz uma arte conceitual, desde as obras minimalistas até painéis gigantes nos quais ocorre uma explosão de elementos, cores e significados.

Sendo um artista que tanto perturba quanto hipnotiza, Francesco Clemente diz que não acredita na pureza. Acredita em contaminação, em encontros de diferentes culturas. Sua arte é, realmente, contaminada. Contaminada de tudo um pouco, menos de prisões.


segunda-feira, 17 de agosto de 2020

Quotes SFU - 14

Sarah: O que diabos está acontecendo, Ruth?
Ruth: Você aparece 20 anos depois... fala mal da minha comida, fica bêbada com meu namorado, enche a cabeça da minha filha com todo tipo de ideia e lembra meus filhos de eventos traumáticos na vida deles.
Sarah: Santo Cristo! Ele ia perder a virgindade mais cedo ou mais tarde. E Fiona é uma grande mulher. Muito compassiva!
Ruth: Ele foi molestado!
Sarah: Era um garoto fogoso de 15 anos que deu uma tremenda sorte.
Ruth: Não me surpreende que você não assuma a responsabilidade. Nunca assumiu.
Sarah: Certo, é disso que se trata...
Ruth: Quando mamãe morreu, alguém teve de tomar o lugar. Alguém teve de cuidar da vovó, mas você fez o que queria.
Sarah: Você nunca deixou ninguém ajudar! Nada podia atrapalhar a pena que você sentia por si mesma!
Ruth: É nisso que precisa acreditar para justificar o egoísmo?
Sarah: O que você quer que eu diga?
Ruth: Quero que você peça desculpas.
Sarah: Está bem, peço desculpas! Fica melhor assim?
Ruth: Não! Por que você se divertiu mais do que eu.
Sarah: Me diverti? O único homem que amei morreu quando eu tinha 21 anos; as crianças que eu tanto queria foram um sonho impossível porque meus ovários são estéreis; e eu sou uma artista horrível, mas vivo cercada de pessoas com talento que nunca vou alcançar. Tudo é difícil, Ruth. Apenas fizemos escolhas diferentes.

Six Feet Under S02E06

domingo, 16 de agosto de 2020

The best of times

Is it love tonight
When everyone's dreaming
Of a better life
In this world
Divided by fear
We've gotta believe that
There's a reason we're here
There's a reason we're here

'Cause these are the days worth livin'
These are the years we're given
And these are the moments
These are the times
Let's make the best out of our lives

Trecho da música "Our lives" (2004), da banda The Calling

sábado, 15 de agosto de 2020

Minha adorável esposa, de Samantha Downing

Por trás da fachada de família perfeita, com residência no subúrbio, dois filhos e empregos estáveis, um casal acima de qualquer suspeita guarda um terrível segredo. Tobias e Millicent matam pessoas. Esta é a premissa de "Minha Adorável Esposa", thriller enviado pela TAG Inéditos no mês de junho de 2020 e estreia da escritora norte-americana Samantha Downing. 

O livro possui uma linguagem cativante e instiga constantemente a curiosidade do leitor. Cada capítulo deixa um cliff hanger para o próximo, tornando difícil deixar de acompanhar o caminho dos protagonistas. A violência da trama só não fica tão pesada pela adrenalina despertada e a rapidez com que os fatos transcorrem pelas páginas. 

Apesar de envolvente, a história é repleta de problemas. O ato final é o que mais sofre desse ritmo intenso da narrativa, sendo porcamente desenvolvido. Downing faz escolhas questionáveis para seus personagens. Também há reviravoltas que deveriam ser surpreendentes, mas se tornam esperadas. 

Em resumo, "Minha Adorável Esposa" possui uma largada estimulante, porém é falho e previsível. Por vezes, provoca revolta, conforme a crueldade empregada nos crimes. Perpassa muitas camadas psicológicas dos personagens e não as utiliza. Mesmo assim, a autora possui o mérito de nos deixar vidrados nos acontecimentos da sangrenta trama. 

BOM
13/2020

sexta-feira, 14 de agosto de 2020

So we don't get separated...


Run, 
Running all the time
Running to the future
With you right by my side
.
Running
Running as fast as we can

Do you think we'll make it
(Do you think we'll make it)
Running,
keep holding my hand

So we don't get separated
.
Sometimes it's hard to keep on running
We work so hard to keep it going
Don't make me want to give up

Trechos da faixa "Running" (2001), da banda No Doubt



quinta-feira, 13 de agosto de 2020

Mapa da felicidade

Eu não estava aqui. Tudo mudou muito rápido e, de repente, vim parar neste lugar que não conheço. Vejo, por trás do vidro da janela, o brilho do sol pousar sobre as colinas. É inverno e sei que está frio lá fora. Deste lado, encontro-me aquecido com o calor que emana da lareira, localizada no canto da sala. A temperatura aqui é agradável.

Por mais que eu tenha chegado há poucos segundos, sinto-me em casa. A decoração que inicialmente me causou estranheza já se torna familiar. Há uma tranquilidade inebriante por aqui. Escuto apenas o barulho do fogo, o resto é silêncio. Permaneço imóvel, apenas observando os detalhes.

Quando estou confortável o suficiente para desfrutar de tamanho aconchego, percebo que algo mudou. A parede que outrora se apresentava como uma imensidade de branco passa a se mostrar manchada, pouco a pouco, por um fio de tinta que escorre do teto. Não é apenas um filete a caminhar. Gotas brotam em todos lugares e descem pela superfície lisa. Todas, aparentemente, são de um azul vibrante, turquesa, que passa a tomar conta dos limites ao meu redor.

Vejo que não há apenas uma coloração. Também aparece uma tonalidade rosa, que passa sem dó por cima do azul. O roxo soma-se à combinação. Já um verde oliva explode com força na minha direita. Estou cercado por este carnaval de pigmentos extasiados. Instaura-se uma euforia no ar. Se antes aquela calmaria transmitia bem-estar, agora me sinto completamente acolhido. Mais que isso, respiro essa efervescência, energia, agitação, pluralidade. Tem-se, então, um espaço de plenitude e de criação. A janela, agora, exibe as colinas multiplicadas, como em um caleidoscópio.

Não há mais silêncio. Escuto uma batida distante. Tum, tun, tunt, tum.  Parece gradativamente se aproximar. Intensifica-se a cada segundo. Soma-se a efeitos, bateria, pulsação. Tenho vontade de dançar. As chamas do fogo bailam comigo. E ditam a iluminação ora acentuada ora fraca do ambiente. Sinto na pele cada uma dessas mudanças, desde a repentina para o local de início e, também, as transformações sucessivas, que aceleram meu compasso.

No auge, como tudo, esse momento vem a ruir. Desfaz-se frente aos meus olhos, que tomam para si a cidade, feita de prédios cinzas, asfalto esburacado, fumaças tóxicas, trânsito, galpões, máquinas, ritmo, trabalho em série, pessoas que vivem de repetição, rotina que garante a subsistência. Uma massa de soldados abaixa a cabeça para um pastor. Sai do templo e comete crimes de discriminação racial, homofobia, violência. Há cinismo, mentira e corrupção por todos os lados. Batidas de carro. Abuso moral e sexual. Violação.

O coração que antes estava acelerado e pleno, agora parece sossegar. Estabiliza-se. É esta a realidade, de pouca esperança. Tudo é fugaz, efêmero, como foi a visita a este lugar onde eu estava em paz, e dancei, com vontade de nunca tê-lo deixado.

quarta-feira, 12 de agosto de 2020

Quotes SFU - 13


Claire: Eu tenho tanto medo de pensar por mim e seguir meu rumo que preciso de segurança ou aprovação. Devo procurar dentro de mim o que eu realmente quero. 
Gary: Claire, você está com medo de fazer esse exame. Por quê?
Claire: Não sei. É que, quando penso nesse exame, me vem uma horrível luz florescente que mostra todas as espinhas e cicatrizes que eu queria esconder.
Gary: Entendi. É bem mais seguro na escuridão, certo?
Claire: Ok. Estás ficando piegas...
Gary: Só quis dizer que estás num ponto que finalmente estás se encontrando. Tem medo que vejam quem você é de verdade. Será assustador. E quer saber? Dá medo, sim. Em todos nós. 

Six Feet Under S02E05

terça-feira, 11 de agosto de 2020

Muito barulho para: Escape at Dannemora

Lançada em 2018 e produzida pelo canal Showtime, "Escape at Dannemora" é uma das minisséries recentes que merecem ser descobertas pelo público. Entre os vários motivos, destaca-se o roteiro baseado em uma história verídica, as ótimas atuações do elenco e o surpreendente comando na direção de Ben Stiller.

A trama se passa em 2015 na localidade de Dannemora, no estado de Nova Iorque, onde funciona a penitenciária de segurança máxima Clinton Correctional Facility, quase na fronteira com o Canadá. É nesse cenário que uma funcionária da casa prisional se envolve emocionalmente com dois presidiários, ajudando-os em um arriscado plano de fuga. 

O início da série pode ser considerado cansativo e monótono, mas é preciso dar uma chance para a narrativa, uma vez que a tensão é criada lentamente até beirar o nervosismo em seu desfecho. O recomendado, entretanto, é não procurar mais informações sobre o caso, deixando-se surpreender. Após devorar os sete episódios, vale buscar os personagens reais e perceber tamanha similaridade e cuidado por parte da produção. 

"Escape at Dannemora" foi indicada em 12 categorias no Emmy. Um dos seus trunfos, certamente, é o time de atores em total entrega, que inclui Benecio Del Toro, Paul Duno, Eric Lange e Patricia Arquette, sendo que esta venceu o Globo de Ouro para Melhor Atriz em Série Limitada.


MUITO BOM